Burajiru e kaerou

Um diário de produção do TCC de Jornalismo para a ECA-USP

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Hiroshi Shimuta e a história dos ex-dekasseguis da Nicom

Dias de muito trabalho foram os últimos e serão os próximos.

Depois do meu último post, no qual eu falava sobre a transcrição da entrevista com a Laura Hasegawa, muitas coisas aconteceram. Tantas que nem tive tempo de escrever aqui. Mas agora o TCC me deu uma folga. Meio involuntária, mas uma folga. Isso porque qualquer pessoa que eu queira entrevistar amanhã ou neste final de semana, certamente estará viajando. São assim os feriados emendados em São Paulo. A cidade fica vazia e cheia de trânsito rumo ao interior e litoral, nas bordas do feriadão. Comigo então não será diferente. Já que nada há para fazer na terra da garoa até segunda-feira, também vou me deleitar ao sossego do interior, mas vou só depois do caos do trânsito. Enquanto não pego a estrada, aproveito para contar como foi a minha semana.

Gostaria de começar pela última sexta-feira, 30 de março. Mas antes, vou ter de voltar um pouco no tempo. Através do Sr. Hitoshi, do Niatre, eu conheci o Sr. Hiroshi Shimuta, no dia 7 de fevereiro. (Atenção, não confundamos o Sr. HiToshi com o Sr. HiRoshi, ok?) O Sr. Hiroshi é uma personalidade um tanto quanto famosa. Dono da grande rede de materiais para construção, Nicom, esse descendente de japoneses me recebeu com toda a hospitalidade que se pode imaginar em seu escritório, localizado na Rua Ática, em Campo Belo, São Paulo. Em meio a cafezinhos, castanhas, chocolates e sorrisos, o Sr. Hiroshi me contou a história de sua vida. Apesar de nunca ter ido ao Japão, ele muito se preocupa com a reinserção ao mercado de trabalho daqueles que vão para lá e ficam muitos anos, voltando desatualizados e desambientados ao Brasil.

Pensando nisso, o Sr. Hiroshi decidiu dar oportunidades de trabalho aos ex-dekasseguis em sua loja. E foi por isso que eu decidi conhecê-lo. Para facilitar o encontro desses retornados com a Nicom, ele cadastrou a empresa no Niatre. Assim, o Sr. Hitoshi encaminha os currículos de quem chega ao centro procurando uma oportunidade de emprego ao Sr. Hiroshi.

Depois de uma longa e produtiva entrevista com o Sr. Hiroshi, combinamos que eu voltaria outro dia para conversar com os funcionários ex-dekasseguis da loja. E foi o que aconteceu na última sexta-feira, 30 de março. Na loja, conheci cinco casos muito interessantes.

Tomio Ando

Em uma visita ao depósito da Nicom, que fica na rua de baixo da loja, conheci o Sr. Tomio Ando. Entre idas e vindas para o Brasil, Ando san morou no Japão por 18 anos, de 1991 a 2009, quando teve de voltar por dificuldades ocasionadas pela crise financeira. Morou nos estados de Aichi e Shizuoka. Apesar da intenção de ficar no Japão por mais uns dois anos, em 2009 o Sr. Tomio perdeu o emprego, na cidade de Toyokawa (Aichi). Segundo ele, a indústria de autopeças em que ele trabalhava chegou a demitir mais de 50% dos brasileiros. “Eu procurava emprego, mas só conseguia encontrar serviço temporário de 15 dias, três semanas. Aí eu tive que voltar para o Brasil”, contou.

Como muitos outros brasileiros que estavam no Japão nessa época, Tomio Ando voltou com o auxílio financeiro que o governo japonês oferecia aos dekasseguis desempregados. A ajuda de cerca de US$ 3 mil por pessoa permitiu o retorno de brasileiros que não tinham sequer o dinheiro da passagem para voltar ao Brasil. Muitas críticas em torno dessa ajuda pode-se fazer. Apesar de ser considerada uma ajuda aos brasileiros, também podemos enxergar como uma limpeza fácil de um problema social. O Japão encontrava-se em uma situação de altas taxas de desemprego, inclusive para os nativos, na época. Assim, pagar a passagem de volta para brasileiros que lá estavam aumentando os índices de desemprego e gerando uma verdadeira massa de pessoas dependentes de seguro-desemprego, auxílio moradia, entre outros problemas, talvez tenha sido a solução mais rápida e barata para o governo japonês. Para garantir que ninguém se aproveitaria da situação, foi imposto um prazo dentro do qual esses beneficiários não poderiam voltar ao país. E aí vem a segunda crítica, seria mesmo justo limitar o direito de voltar ao Japão a esses cidadãos? Enquanto o Japão precisou da mão-de-obra estrangeira nas fábricas, era muito fácil conseguir o visto de trabalho. Mas, diante da situação de crise, o governo japonês literalmente despachou essa massa de trabalhadores, proibindo-os de voltar à terra do sol nascente até que a crise passasse. Críticas negativas à parte, o fato é que esses US$ 3 mil per capita ajudaram muitas pessoas que se viram desesperadas no Japão, sem emprego, sem dinheiro para o próprio sustento e, muitas vezes, até mesmo sem casa.

Tomio Ando então deu entrada na papelada para receber o auxílio do governo, comprar sua passagem e voltar para o Brasil. Hoje ele é funcionário da Nicom, mas confessa que a readaptação ao Brasil depois de tantos anos não está sendo fácil. “A cultura é diferente. Eu estou sentindo muito essa diferença”, comentou. Mesmo para conseguir trabalho, as dificuldades foram grandes. “Foi difícil encontrar emprego, porque a gente mandava currículos e não tinha retorno. Aí, através do Niatre, eu consegui esse emprego aqui na Nicom, com o Sr. Hiroshi Shimuta”, contou.

Maeda

Como nem tudo são flores, chegamos ao meu primeiro problema técnico na entrevista com o Gervásio Sadao Maeda, funcionário da loja da Nicom. Depois de mais de 1 minuto de gravação sem áudio, porque eu não havia conectado o microfone na câmera direito, Maeda me contou a sua história.

Ele mesmo não chegou a ser despedido do trabalho, mas como a empresa estava em ritmo bastante desacelerado, ele ficou 3 meses em “stand by”, recebendo apenas 60% do salário habitual, pagos pelo governo japonês. “A fábrica em que eu estava tinha em torno de 600 brasileiros, ficou em torno de 10%. Umas 60 pessoas, mais ou menos. Eu fiquei no meio desses 60 e continuei até 2011, quando deu o terremoto lá e depois veio o tsunami”, contou Maeda.

Jorge Yida

Jorge Tiaki Yida foi para o Japão em 1992, procurando uma alternativa à crise do governo Collor no Brasil. Assim como Maeda, o Sr. Yida enfrentou as dificuldades durante a crise de 2008, mas teve de voltar depois do terremoto seguido de tsunami, que atingiu o Japão em março de 2011.

Nesses 19 anos de Japão, Yida san morou nos estados de Tokyo, Kanagawa, Aichi e Ibaraki. Ao voltar ao Brasil, uma de suas maiores dificuldades foi arrumar trabalho. “Para arrumar emprego foi seis, sete meses, mais ou menos”, contou. Mais apuros do que o Sr. Yida, passou o irmão dele, que voltou para o Brasil com o subsídio do governo japonês.

Osvaldo

Como desgraça, assim como barata, nunca vem sozinha (meu namorado fez essa observação há alguns meses, e, desde então, ela sempre foi comprovada: quando aparece uma barata em casa, logo aparecerá a segunda, porque elas nunca andam sozinhas), o meu primeiro problema técnico também não foi o único. A segunda zica aconteceu no mesmo dia da primeira, na entrevista com mais um funcionário da loja da Nicom, Osvaldo Kitamura. Acredito que também por má conexão do microfone com a câmera, o áudio ficou mais baixo do que o habitual, além de ruidoso. Acho que isso não impedirá o aproveitamento da gravação, mas, de qualquer forma, não ficou muito bom. Hoje voltei à Nicom e retomei a entrevista com o Osvaldo. Na hora da edição, veremos o que vou poder usar no filme.

Osvaldo foi para o Japão em 1999, por dificuldades de conseguir emprego aqui no Brasil. Após seis meses trabalhando sozinho lá, sua esposa e a filha de 11 anos foram ao seu encontro e por lá eles ficaram até 2011. A crise não foi motivo para a família Kitamura voltar para o Brasil, porque, apesar de ter perdido o emprego, Osvaldo continuou trabalhando no que ele chama de “arubaito fixo”. Arubaito é o nome dado aos empregos temporários no Japão. No popular, os bicos. Apesar de ser arubaito, Osvaldo contou que ele ia trabalhar todos os dias, o que garantiu a estabilidade financeira da família durante um ano, o ano da crise. Depois disso, a fábrica de autopeças que o havia mandado embora o chamou de volta.

A filha de Osvaldo estudou durante três anos em escola japonesa. Depois, foi para uma escola brasileira no Japão, onde cursou até a 2ª série do Ensino Médio. O 3° ano ela cursou pelo Supletivo e hoje faz faculdade aqui no Brasil.

Mário

O quinto funcionário da Nicom é o Sr. Mário Takahashi. Mas com ele eu ainda não consegui conversar, devido ao grande movimento no depósito da Nicom, que é onde ele trabalha. Entretanto, ficamos de marcar uma entrevista em casa dele, junto com a sua esposa, que também morou no Japão.

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